domingo, 20 de janeiro de 2008

Portugal na Balança da Europa

Almeida Garret



Universidade dos Açores
Estudos Europeus e Politica Internacional




Cláudio Borges Almeida

Na obra, a que ora chama de “reflexões”, ora de “ensaio”, Portugal na Balança da Europa, após fazer um excurso sobre a situação politica da Europa e sobre a forma como o poder se comportava perante as cortes e as “constituições”, esvaziando-as de conteúdo, Almeida Garrett centra a sua atenção no papel que a descoberta da América teve nos destinos da Humanidade e na reconfiguração dos princípios da Liberdade, Igualdade e direito à propriedade, elementos fundamentais para o que o autor considera ser a base da felicidade humana.
Descoberto por acaso, à decadência moral e politica da Europa, a América, o Novo Mundo, surgiu como possibilidade de angariação de ouro, um espaço novo, rico e vigoroso, de onde podiam retirar sustentação os regimes políticos opressores que viviam num “falso equilíbrio”, visto que a sua base de governação era a da “cegueira dos povos”. A América aparece, então, como um conjunto de potencialidades – a vastidão do espaço e as suas riquezas, a quase ausência de opressão de classes dominantes, no início do processo de colonialização -, que levavam a que a propriedade aliada ao trabalho promovesse a produção repartida.
Ora, são esses aspectos que Garrett, numa perspectiva liberal, realça da importância que a América teve na educação moral e política do poder colonializador e dos povos da Europa, subjugados pela tirania e cegos pela religião, sem esquecer que o Velho Mundo se fez representar no Novo com os seus vícios, luxos e perdição (inclusive pela aliança histórica que, nos estados europeus, sempre se deu entre poder e religião).
A verdade é que a América foi uma fonte de riqueza, mas também de novas ideias que germinavam, por isso, as monarquias e oligarquias se assustaram: queriam usufruir da riqueza e sufocar as novas ideias.
Nesse espaço novo começou a surgir também um novo homem, exemplo para os que viviam subjugados, não participavam na gestão do bem comum, nem da produção recebiam qualquer dividendo.
A América foi, deste modo, o espaço em que a liberdade sufocada na Europa se acoitou, porque a máquina do Estado aí não encontrava terreno muito propício à sua acção. No entanto, a força, no processo histórico da construção da América, não deixou de ser utilizada, porque o despotismo não podia deixar escapar a sua fonte de sustento.
Analisando, por outro lado, a influência da religião na causa da humanidade (não se pode esquecer que humanidade e liberdade, para o autor, são sinónimos), Garrett não deixa de tecer críticas àquilo a que chama de “funesta liga sacrilegamente chamada do trono e do altar” .
Revelando a sua posição anti-clerical, para o autor, o espírito do Cristianismo, promotor da liberdade, do consolo, de conforto e promessa de justiça, foi adulterado pelos déspotas, e o clero foi a voz que divulgou a deturpação desse mesmo espírito. Durante séculos, até à Reforma, o Cristianismo serviu não o homem mas a tirania. No Novo Mundo, o espírito inicial cristão foi retomado, e a religião foi a promotora da liberdade; aí todos eram produtores, logo o parasitismo social tinha pouca margem para se desenvolver. O que não acontecia historicamente na Europa, onde a máquina do poder assegurava, através de maquinações de gabinetes, os abusos e a tirania.
O sistema da Liberdade americana baseou-se, portanto, na libertação do jugo do opressor, na criação de uma república, num pacto que não fosse oneroso para os governados, e segurasse suficiente força aos governantes.
Apesar do sistema federativo já existir na Europa, mas sem nexo, sem centro, sem um ponto director alheio individualmente a cada um dos Estados de per si, os Estados Unidos implementaram o princípio regulador desse sistema: dividiram o vasto espaço em porções e apresentaram-se ao Mundo como um todo coeso.
Para Garrett, esta foi a verdadeira lição que a América deu aos povos oprimidos da Europa que, a partir dela, começaram a ver que era possível uma outra forma de se ser governado e de usufruir da Liberdade. Foi ainda esta lição que desencadeou uma série de revoltas, com epicentro na Europa Central, mas que rapidamente se alastraram ao restante território europeu.
Os factos históricos que suportam a opinião Garretiana, acerca do processo de libertação da América, são fundamentalmente a “Revolta do Chá” em 1773, grito de libertação do jugo tributário, na medida em que à taxa paga não correspondia uma participação efectiva nos destinos da governação (“No representation, no taxation!”); a que se seguiu a Guerra que culminou, em 1776, na Declaração da Independência do Estados Unidos da América.
As repercussões históricas na Europa desses factos consubstanciaram-se na Revolução Francesa, em 1789, e na libertação de várias outras colónias, como foi o caso de vários Estados modernos da América Latina, inclusive o Brasil que se tornou independente em 1822.
Na visão liberal e romântica de Almeida Garrett, a América surgiu como uma fonte regeneradora do mundo que a descobriu por acaso, no sentido em que veio aprofundar, pelo seu funcionamento político, social e moral, o conceito de liberdade, em que todo o homem, sendo produtivo, deve participar no todo que é o Estado, e deste modo confirmar-se que, se “A pobreza é o maior de todos os males”, a riqueza e a participação activas na república são fundamentais para a construção da Liberdade.

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A Guerra nos Açores




José Damião Rodrigues









A Orgânica Militar da Fronteira Açoriana Séculos XVI-XVII





Politica externa Portuguesa
Prof. Doutora Susana Costa
Claudio Almeida











“Todas as sociedades se hierarquizam em função de um centro”. Assim acontece com os Açores relativamente ao poder central de Lisboa, o mesmo tendo ocorrido em relação ao poder interno Regional, centrado em Angra do Heroísmo, nos séculos XVI e XVII.
Os Açores foram “achados” em 1427, num período muito próximo da expedição à Gran – Canária e do povoamento da Madeira. No início dos descobrimentos das Ilhas insulares Afonso V de Portugal nelas mandou distribuir animais e mais tarde degredados e escravos -“ tratava-se de assegurar o seu povoamento, com a obrigatoriedade de fixação nas mesmas de um contingente humano” – utilizando-os para desbravar a terra e experimentar as primeiras culturas, garantindo-lhes as condições mínimas de subsistência e o desenvolvimento das primeiras explorações económicas para, numa fase posterior, em 1439, iniciar-se a ocupação das ilhas com os primeiros povoadores. Com a chegada dos “povoadores oficiais” , nomeadamente os vindos da casa de D. Henrique, oriundos essencialmente do Algarve, e a constituição de Capitanias donatárias, os Açores começam a demarcar-se como uma fronteira natural devido à sua localização geográfica e ao importante apoio às navegações que vinham das Índias e de África.
O estabelecimento das rotas marítimas realçam a importância dos Açores nas posições estratégicas do mundo da época. As ilhas açorianas tornam-se o principal ponto de paragem para as naus Portuguesas e Inglesas nas rotas comerciais com as respectivas colónias, não só como ponto de paragem para o reabastecimento das naus mas também para escoamento dos seus produtos.


Nesta rota de naus carregadas de ouro, marfim, especiarias, escravos e outras riquezas da época provenientes das Índias, África e Brasil com destino à Europa, torna-se necessário a protecção dos portos das ilhas açorianas e da sua costa marítima contra ataques de corsários, nomeadamente Argelinos e Turcos, e mais tarde Franceses e Holandeses. O reconhecimento dessa importância estratégica pode ser comprovado pelas pequenas fortalezas mandadas construir junto à costa, muitas delas em ruínas mas ainda existentes, tal como D. Manuel mandara fazer nos pontos estratégicos que considerava importantes para a rota da Índia, ou quando em 1567 Pompeo Arditi, agente italiano, foi contratado por Portugal com a missão de ver as ilhas e informar o rei da sua situação, com dados sobre o numero de moradores, vida económica, estado dos portos e direitos reais e de estudar medidas defensivas contra o corso, ou ainda quando o autor afirma que os habitantes das ilhas, pelo facto de se encontrarem à mercê dos ataques de corsários e piratas “ vivem como em forma de fronteira de inimigos ”. E de facto assim era. As ilhas, sobretudo as mais pequenas, continuaram vulneráveis aos ataques do corso, como se narra numa breve notícia da vitória alcançada em Junho de 1632 pelos moradores do Corvo contra uma armada Turca.
É interessante verificar que no relatório que Pompeo Arditi fez sobre as ilhas açoreanas, define Santa Maria como uma ilha apropriada para a produção cerealífera e criação de gado. Graciosa, Flores e Corvo são considerados “pequenas ilhas”, e alem de pequenas são de “pouca utilidade”. Defende também que as ilhas do grupo central, nomeadamente Pico e Faial deveriam ter uma actividade principal, mas diferente de uma ilha para a outra. No caso do Pico, escreve que a ilha é habitada unicamente por pastores “que vivem como selvagens e se alimentam de animais que apanham na floresta dos quais a ilha procria infinita quantidade ”, e afirma que a sua especialização deveria ser essencialmente dedicada à pastorícia. Já relativamente à ilha do Faial, é uma ilha propícia ao cultivo de quintas, deste modo deveria se especializar neste ramo.
Assim, podemos verificar que, se do ponto de vista da geografia politica e administrativa o arquipélago dos Açores é um espaço periférico quando visto de uma óptica a partir do reino, internamente podemos constatar, com base em diversos indicadores, uma hierarquização espacial que marginaliza algumas das ilhas.
Já em 1581, quando da legitimação de Filipe II de Espanha como rei de Portugal, dão-se nos Açores, que mantinham a resistência a Filipe de Espanha, algumas batalhas entre espanhóis e portuguesas para a tomada das ilhas açoreanas. A primeira, que é liderada por Pedro Valdês, para conquistar Angra em 25 de Julho de 1581, chamada a batalha da Salga, na qual os Espanhóis caiem derrotados. A segunda batalha é travada na ilha de São Miguel, a 26 de Julho de 1582, em vila Franca do Campo, entre as tropas de D. António Prior de Crato e Espanhóis, em que a armada Espanhola sai vitoriosa. A última, chamada Batalha de Mós, a 26 de Junho de 1583 na ilha da Terceira, leva a que Filipe II passe a dominar todo o território português, onde se evidenciam as ilhas dos Açores, como peça fundamental para controlo da rota do oriente.
Deste modo, as ilhas dos Açores reafirmam a sua importância e torna-se centro de toda a actividade náutica do Século XVI e XVII, passando a ser um porto de escala obrigatória para as naus vindas da Índia. Quem controlasse os Açores controlava toda a navegação do Atlântico. Facto que demonstra o poder da política externa portuguesa no reinado de Afonso V e posteriores.
Em pleno século XXI a situação geográfica dos Açores continua a conferir-lhes um importante papel na estratégia geopolítica mundial como ponto chave para o controlo de todo o Atlântico norte, agora não tão importante no que se refere à navegação marítima mas sim na navegação aérea.
Os Açores são um pilar fundamental para a política externa portuguesa e conferem ao Estado português um excelente meio de negociação, evidenciando a sua importância na senda da política de estratégia internacional.

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