sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

A visita do Sr. Ministro e o atraso de muitos anos.

Na sequência da recente visita do Ministro da Justiça à nossa Região Autónoma e da sua comunicação de que os Açores seriam a primeira região do país a erradicar o “balde higiénico” (balde, feito em chapa zincada, colocado a um canto da cela, onde os reclusos defecam e urinam), consultei alguns “sítios” da Internet e fiquei a saber o seguinte:

Num estudo da Provedoria de Justiça, de 1996, descreve-se a lastimável situação verificada nas cadeias portuguesas, e sobre as dos Açores diz-se o seguinte: Na de Angra do Heroísmo: “…as celas e camaratas são más: o espaço é reduzido, sem sanitários (apenas balde) e com lavabo. Os balneários são péssimos, com um cheiro irrespirável e sem luz natural. O estado de higiene e conservação das casas de banho é péssimo …a cela disciplinar é uma autêntica gruta: tem 1,5m por 1,5m, um respiradouro minúsculo (buraco de 2cm) sem luz natural, muito suja, cheia de humidade e com mau cheiro…”. Na de Ponta Delgada: “…tem uma lotação oficial de 100 reclusos, encontrando-se, no dia da inspecção, …apresenta uma situação grave de sobrelotação”. Na Cadeia de apoio da Horta: “Trata-se de uma cadeia muito pequena, com lotação para 18 reclusos, que serve de apoio à de Angra do Heroísmo… os quartos são pequenos, húmidos e com pouca luz. O balneário apresenta-se em péssimas condições, com mau cheiro, sujo e deteriorado...”;

No relatório da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, elaborado em Fevereiro de 2003, pode ler-se” Se Portugal, com uma população de 10 milhões de habitantes, estivesse alinhado com a média europeia (15 países) teria cerca de 9 200 reclusos, quando na realidade teve (em 2002) cerca de 14.000 (mais 52,2%) ”. E ao referir-se à sobrelotação das prisões portuguesas diz “… o sistema prisional não é, nem pode ser, um gueto, colocado fora das fronteiras da sociedade e das suas principais preocupações, nem pode ser relegado, pela desatenção e desleixo de governantes e governados, para uma condição que o transforme em mero depósito de homens e mulheres…. A situação qualitativa dos reclusos em Portugal é manifestamente pior do que podia e devia ser…”.

Dados estatísticos da Direcção Geral dos Serviços Prisionais referentes aos anos posteriores a 2003 continuam a mostrar a sobrelotação das cadeias portuguesas, destacando-se as dos Açores. Em 2006, a cadeia de Angra, com uma lotação para 39 reclusos apresentava-se com 80 presos e a de P. Delgada com uma lotação para 141 tinha 182 reclusos, numa clara demonstração do grande aumento da criminalidade.

Terá sido com base no estudo da Provedoria de Justiça que o XIV Governo Constitucional, então chefiado pelo Primeiro-ministro António Guterres, inscreve no Plano e Orçamento do Estado para 2002 (Lei 109/2001) a construção do estabelecimento prisional de Angra do Heroísmo, com uma programação financeira plurianual correspondente ao valor do investimento. Porém, nada se fez.

Dois anos mais tarde, O XV Governo, na altura liderado pelo actual presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, novamente contempla a construção da nova cadeia de Angra nas grandes Opões dos Planos para 2003 (Lei32-A/2002) e para 2004 (Lei 107-A/2003). Novamente, nada se fez.

O XVI Governo, o de Santana Lopes, nada disse sobre o assunto. Apenas governou sete meses.

Agora, passados onze anos do estudo da Provedoria de Justiça, vem o Sr. Ministro anunciar que as prisões nos Açores não mais vão ter o balde higiénico; que tomou a decisão de vender o edifício onde funcionam os serviços prisionais de P. Delgada (sem dizer como e para quando está planeada a sua substituição) e que em 2008 se iria iniciar a construção do novo estabelecimento prisional de Angra do Heroísmo.

Por mais que procurasse não consegui encontrar nas Grandes Opções do Plano para 2005-2009 (Lei 52/2005) do actual Governo da República nada que, em concreto, se referisse á construção do novo estabelecimento prisional de Angra do Heroísmo. Nas Opções dos Planos para 2006 e 2007 nada vi. Todavia, o orçamento do Ministério da Justiça para 2007 contempla a verba 800.000€ na rubrica medidas/projectos/sub projectos, possivelmente para pagamento do respectivo projecto. Aguardemos pelo Plano e Orçamento do Governo para 2008.

Também nada encontrei que me fizesse perceber como é que na construção de uma prisão, que já devia ter sido feita há muito tempo, e na “erradicação do balde higiénico” se pode “ recuperar, nos anos imediatos, o atraso de muitos anos”, como disse o Presidente do Governo Regional, em conferencia de imprensa, quando da visita do Ministro.

Cláudio Almeida
P. Delgada, 25/09/2002
Http://paralelosocial.blogspot.com

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